Da Índia: Discurso de Dilma no Seminário Empresarial Brasil – Índia: uma nova fronteira para oportunidade de negócios

Nova Délhi - Índia, 29/03/2012. Presidenta Dilma Rousseff posa para foto junto com os Chefes de Estado do BRICS. Foto: Roberto Stuckert Filho/PR.Leia aqui a íntegra do discurso da presidenta Dilma Rousseff, feito hoje em Nova Délhi, no encerramento do Seminário Empresarial Brasil – Índia. Como grande mercado, a Índia é o segundo país mais populoso do mundo, com 1,2 bilhões de habitantes, ficando atrás da China, com 1,3 bilhões. As relações Brasil/Índia foram iniciadas em

governos anteriores, mas foram  intensificadas no governo Lula. Dilma dá continuidade num cenário mais favorável, pois, enquanto os países então desenvolvidos hoje passam dificuldades,  os dois países são emergentes e têm suas potencialidades,  de forma que um pode colaborar com o outro em suas deficicências. Coincidência: o Brasil foi descoberto por acaso pelos portugueses que na realidade estavam a caminho das Índias.

Nova Délhi-Índia, 30 de março de 2012

…das Confederações de Comércio e Indústria da Índia,
Rajkumar Dhoot, da Associação das Câmaras de Comércio e Indústria da Índia,
R V Kanoria, da Federação das Câmaras de Comércio e Indústria da Índia,
Deep Kapuria, da Confederação da Indústria da Índia,
Meu caro Paulo Tigre, vice-presidente da Confederação Nacional da Indústria,
Senhoras e senhores empresários indianos e brasileiros que participam desta missão empresarial,
Senhoras e senhores,
   
Quero, inicialmente, saudar as autoridades governamentais, os empresários, os acadêmicos, os jornalistas e todos os que trabalham pelo estreitamento das relações entre nossos países.

Eu tenho certeza que a Índia e o Brasil são e serão parceiros estratégicos. Essa nossa parceria estratégica, que se iniciou no governo do presidente Lula e que tinha iniciativas anteriores, mas que foi reforçada no governo do presidente Lula, ela se expressa no campo político, porque lutamos, os dois países, por instituições que reflitam a realidade de um mundo multipolar e os valores democráticos que nós cultivamos em nossa sociedade.

Mas elas se expressam também nos fóruns econômicos, nos fóruns comerciais, com o nosso firme propósito de que a governança desses fóruns reflita a mudança expressiva que ocorreu na economia internacional com a emergência do Brasil e da Índia, da Índia e do Brasil, no cenário internacional com um modelo de desenvolvimento baseado no crescimento acelerado da sua economia, na distribuição de renda em relação à sua população, até então excluída, na inclusão de milhões e milhões de pessoas aos bens e aos serviços da sociedade de consumo.

Nós, como países que viveram essa experiência em plena democracia temos muito a compartilhar. Temos muito a que transmitir como experiência para todos os países em desenvolvimento e, ao mesmo tempo, afirmar a importância dos nossos países em relação à comunidade internacional.

Todos nós aqui sabemos que o mundo vive uma grave crise econômica, que expôs a fragilidade da governança internacional, que expôs o absoluto descontrole das relações financeiras dos países desenvolvidos e, também, evidenciou as dificuldades enfrentadas, hoje, por esses países, no que se refere ao desemprego assustador e a perda de direitos sociais conquistados ao longo de várias décadas.

Diante disso, nós todos vivemos, desde 2008, e em momentos de agudização da crise, o ano passado, nós vivemos um processo que, apesar da crise não ocorrer e não ter sido produzida nos nossos países, sofremos os efeitos dessas crises, tendo as nossas economias sofrido um processo de desaceleração econômica derivado deste cenário internacional.

Mas o potencial das nossas economias é inquestionável. Primeiro porque nós temos hoje um padrão de crescimento que é virtuoso. Na medida em que incorporamos milhões e milhões de pessoas como consumidores, produtores, pequenos agricultores, trabalhadores as nossas economias se impulsionam baseado em seu próprio mercado interno e na sua capacidade de se posicionar no mercado internacional, exportando bens e serviços e, ao mesmo tempo, entre nós, também, investindo diretamente uns nos países dos outros.

Temos, portanto, um quadro imenso de perspectivas a nossa frente. Este ano, na Cúpula do G20, no México, nós, sem dúvida, vamos transmitir uma forte mensagem de coesão política. Nós, Brasil e Índia, Brasil, Índia, China, Rússia e África do Sul.

Nós, Brasil e Índia, temos sólidas credenciais para lutar contra os efeitos das políticas monetários expansionistas do mundo desenvolvido que não tem tomado as providências necessárias para garantir uma expansão das suas economias. Somos, sem sombra de dúvida, favoráveis à superação da crise na Europa. Achamos que houve uma melhora na medida em que foi evitada uma crise mais aguda, uma crise monetária mais aguda e acreditamos que é imprescindível que os países desenvolvidos tomem medidas efetivas para garantir a retomada da economia mundial.

Mas, Brasil, Índia e os países emergentes são hoje os grandes responsáveis pelo crescimento da economia internacional. Nessa medida, a relação entre a Índia e o Brasil se insere, neste momento, não como um desafio, mas, sobretudo, como uma grande oportunidade para os povos dos dois países. Tanto a relação de seus empresários, como de seus acadêmicos, da sua área científica, dos seus governos, enfim, da área cultural permite que nós possamos ter uma influência muito grande nas condições pelas quais o mundo vai retomar o seu crescimento.

E, ao mesmo tempo, essa relação reforça uma tendência de profunda transformação que ocorre no mundo, no sentido da importância das economias dos chamados países emergentes, dos países BRICS, e da Índia e do Brasil, em especial. Essa tendência de profunda transformação nos fluxos dos comércios e nos investimentos internacionais.

No passado, estes se estruturavam, tanto os fluxos de comércio como os investimentos, em torno do eixo Norte-Sul. Hoje, fica evidente que as relações entre nós não são apenas vantajosas e produtivas, mas representam importante fonte de dinamismo para a economia internacional.

Quando nós exploramos as nossas complementaridades, respeitando, cada um, a característica do outro, nós podemos enfrentar juntos, de forma muito mais efetiva, todos os desafios que a conjuntura nos apresenta. Por isso, eu tenho certeza que o dinamismo característico das nossas economias permitirá que superemos no melhor sentido esta fase crítica da economia internacional.

Por isso é com alegria que eu vejo a nossa relação comercial se tornar cada vez mais expressiva. O Brasil permanece com principal parceiro comercial da Índia na América Latina. Nossos países intensificaram o intercâmbio comercial de forma notável nos últimos anos e temos um crescimento expressivo de 200% nos últimos cinco anos. Em 2011, nosso intercâmbio atingiu US$ 9,2 bilhões. Um expressivo aumento de 20% em relação ao ano anterior. E temos o desafio de ampliá-lo cada vez mais reforçando os nossos laços. Porque sabemos que ainda é pouco o que conseguimos diante do potencial que cada uma de nossas economias tem.

Nós podemos e devemos intensificar nosso comércio que ainda hoje está muito concentrado no petróleo e nos seus derivados. Não porque não seja importante o petróleo e seus derivados, mas porque o nosso potencial permite que além do petróleo e dos derivados do petróleo nós sejamos capazes de uma maior amplitude e uma maior diversidade nas nossas transações comerciais. Por isso acreditamos que a meta de US$ 15 bilhões nas nossas relações comerciais bilaterais até 2015 é inteiramente passível de ser atingida.

Nós dispomos de instrumentos importantes. O Brasil, dentro da região latino-americana, por meio do Mercosul, pode viabilizar uma relação comercial muito forte com a Índia através da integração e da cooperação. Por isso, esse encontro empresarial, que eu creio que deve se institucionalizar, é um instrumento muito importante para que nós tenhamos relações comerciais cada vez mais sólidas e mais profundas.

Este encontro, ele vai dar contribuição para que nos identifiquemos oportunidades, travemos conhecimentos pessoais que permitam, inclusive, parcerias específicas entre empresas brasileiras e empresas indianas, e que permitam uma ampliação do investimento da Índia no Brasil, e do Brasil na Índia.

Nós consideramos que é fundamental estimular a associação entre empresas indianas e brasileiras para empreendimentos comuns. Não só a ação de empresas no Brasil ou na Índia, mas parcerias entre os empresários, no sentido de potencializar as nossas relações.

Precisamos também estabelecer parcerias e pesquisas tecnológicas, porque somos países que temos que arcar com um grau de desafios muito amplo. Ao mesmo que nós devemos combater a pobreza, a miséria e fazer com que os nossos povos saiam da condição de países que são conhecidos por estarem com a maioria da sua população abaixo da linha de pobreza para países que fazem com que a sua população possa ascender à classe média, nós também temos de cuidar para que a grande alavanca da inclusão social permanente e definitiva – que é a educação, a ciência e a tecnologia – tenha lugar nas nossas parcerias.

De fato, eu acredito que, para os nossos países e com as nossas características, nós temos muito o que dialogar uns com os outros. Dialogar na área das políticas sociais e dialogar na área das políticas científicas e tecnológicas.

O nosso ministro Anand Sharma apresentou aqui uma área que é essencial, que é a área dos produtos farmacêuticos. O Brasil é um grande comprador de produtos farmacêuticos, porque nós implantamos, desde 1988, um programa que foi o Sistema Único de Saúde.

O Brasil pretende construir um sistema de saúde que seja universal, gratuito e de qualidade. Obviamente, uma das barreiras para um sistema deste porte é o acesso a medicamentos de qualidade, principalmente quando se trata de questões como os antirretrovirais, quando se trata, também, de remédios anticâncer e nós temos, hoje, a possibilidade de uma grande parceira entre o Brasil e a Índia nessa área, que representa, justamente, o uso da tecnologia mais avançada, em benefício de uma política social, inclusiva e que beneficia, diretamente, a saúde das populações.

Mas, eu gostaria também de enfatizar que nós temos um desafio que é cooperar nas áreas de tecnologia mais avançadas. Na área de defesa, há um amplo espaço para a nossa cooperação. A associação entre a Embraer e a DRDO, Defence Research and Development Organization, para o desenvolvimento de aeronave equipada com sistema de radar desenvolvido pela Índia é um exemplo que nós devemos seguir e perseguir por outros setores.

Também estamos prontos a contribuir para os esforços do governo indiano na busca de alternativas energéticas sustentáveis. Setores como de biocombustíveis, em particular o etanol, podem dar novo dinamismo ao nosso intercâmbio. Empresas indianas, inclusive, estão no Brasil desenvolvendo projetos nesta área. Estamos dispostos a compartilhar nossa experiência nessa questão e desenvolver parcerias industrias e tecnológicas com a Índia. Seja no que se refere à tecnologia de produção do etanol, seja em pesquisas ligadas ao etanol de segunda geração, seja, também, através da tecnologia dos carros flex-fuel, que usam etanol ou qualquer combustível derivado de petróleo – gasolina, por exemplo – sem interferência de quem dirige o automóvel.

Eu vejo, também, com muita alegria as excelentes perspectivas para os fluxos de investimentos mútuos. Não só há amplo interesse governamental em implementá-los, como, também, o setor privado está despertando para as imensas potencialidades existentes entre os dois países.

Tive com os empresários que estão aqui nesta reunião – os empresários brasileiros – uma excelente conversa sobre todas as perspectiva de investimentos em várias áreas que vão, necessariamente, da área de tecnologia da informação, passam, justamente, por essa do etanol, como também abrangem a área de logística, a própria pesquisa que o governo brasileiro pode oferecer para o governo indiano e também para seus empresários na área de processos de logística também, e de manutenção e refrigeração de alimentos.

Um exemplo dessas parcerias que têm sido feias, eu gostaria de me referir à boa parceria e muito bem sucedida entre a Marcopolo, que é uma empresa brasileira no ramo das carrocerias de ônibus urbanos, com a Tata Motors, maior empresa do setor automobilístico indiano. Tal exemplo está longe de ser o único. Hoje, nós temos atualmente trinta e três empresas indianas com unidades próprias ou joint ventures no Brasil em setores como químico, o farmacêutico, o sucroalcooleiro, a tecnologia da informação e vários outros. Há investimentos brasileiros também no automobilístico, também tecnologia da informação e mineração, energia, biocombustíveis e calçados.

Eu estou segura de que as exportações do agronegócio brasileiro vão ter aqui na Índia um espaço tanto na cadeia de processamento de alimentos, como na cadeia de refrigeração que vai ser possível de ser construída aqui na Índia.
Entre os desafios que o Brasil e a Índia enfrentam para manterem suas trajetórias de crescimento com inclusão social está a carência de infraestrutura adequada que atua, geralmente, como uma barreira para que se possa acelerar o crescimento.

O Brasil tem feito todo o esforço nessa área e atualmente temos também grandes empresas especializadas em engenharia de grande porte. E, ao mesmo tempo, o Brasil oferece perspectiva de investimento, oportunidades de investimento uma vez que, não só as nossas próprias necessidades – aqui foi falado sobre o Programa de Aceleração do Crescimento que é, sobretudo, um programa de infraestrutura, mas também diante dos grandes eventos que vão ocorrer no Brasil, como a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016.

Eu queria dizer para os senhores integrantes do governo e também para os senhores empresários presentes que as relações do Brasil com a Índia, elas são antigas, elas datam do início da época em que imperava o comércio entre todas as regiões do mundo, mas em especial entre a Europa, suas colônias e a Índia.

E, naquela época, os navios da chamada “Carreira das Índias” ou da “Carreira da Índia”, eles ligavam o Atlântico ao Oceano Índico em busca de temperos e das gentes, que fizeram a fortuna no comércio trafegando e navegando por esses mares.

O Brasil, aliás, foi descoberto porque se supunha que o Brasil era a Índia. Então, nós iniciamos as nossas relações através de uma suposição incorreta dos navegadores portugueses. Mas, a partir daí, as nossas relações se tornaram constantes, através de portos brasileiros – como o Porto de Salvador e o Porto do Rio de Janeiro. Talvez, essa ligação entre o Brasil e a Índia foi a maior ligação, eu acredito que tenha sido a maior ligação por ligação marítima, por navegação à vela do mundo. E ela fez a riqueza e a cultura de muitas regiões do mundo, não só do Brasil e da Índia, mas, seguramente, de alguns países da Europa. E ela faz parte da ancestralidade brasileira.

O Brasil, durante muito tempo, teve as cores da Índia – os seus verdes, os seus azuis, ou seus rosas -, antes da chegada da navegação, aliás, antes da chegada nos portos brasileiros do príncipe regente, do imperador, depois, acompanhado pelos navios ingleses. E aí, nós mudamos para o cinza, para o preto e para o branco.

Mas essa cor que a Índia trouxe ao Brasil, ela ainda contagia o nosso imaginário e faz parte da nossa cultura. Porque sempre os navios que vinham da Índia ou que iam para Índia tinham uma passagem pelos portos brasileiros.

Portanto, as insistências desses comerciantes brasileiros e indianos que, no passado, diante de tantas dificuldades conseguiram se relacionar, agora, quando os dois países têm a sua soberania conquistada e implantada, é justo que nós façamos uma nova carreira das Índias e que tenhamos, entre nós, uma relação muito efetiva entre empresários brasileiros, comerciantes, e que vão investir, cada um, nesses países e entre, também, seus governos.

Por isso, eu queria dizer que nessa reunião desse fórum empresarial, que nós gostaríamos que se revitalizasse e ficasse permanente, o que nós iremos fazer é, justamente, criar esse corredor entre o Brasil e a Índia de tal forma que nós possamos nos orgulhar de termos iniciado uma nova era. E eu concordo com o ministro Anand Sharma. De fato, esse século XXI é o século dessa nova Carreira das Índias.

Eu queria agradecer o governo, mais uma vez, o governo do primeiro-ministro Singh pela excepcional recepção dada a mim e à minha delegação. Queria agradecer também, aqui, as associações empresariais que nos recebem nesse fórum. E queria dizer que eu considero muito significativa, agradecendo aos empresários brasileiros, a presença deles acompanhando a minha delegação, e estabelecendo aqui uma relação direta com os empresários indianos.

Esse é um momento especial nas relações do Brasil com a Índia. Acredito que o esforço do governo e dos empresários, do Brasil e da Índia, vão garantir que de fato esse seja um século que nós possamos nos orgulhar.
Muito obrigada.  

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