Há 54 anos acontecia a cerimônia de Dedicação da Abadia de Nossa Senhora da Santa Cruz, de Itaporanga (SP)

Por Ir. Alexandre, O. Cist. Hoje (12/11) comemoramos a Dedicação da Igreja Abacial e Paroquial de São João Batista, ocorrida na mesma data no ano de 1967 sob o Abaciado de Dom Atanásio Merkle, O. Cist. e a sob a jurisdição espicopal de Dom José Carlos de Aguirre, bispo de Sorocaba – SP.

A história da Paróquia de São João Batista, porém, é muito anterior à chegada dos monges cistercienses alemães em Itaporanga no ano de 1936. Ela remonta, na verdade, ao ano de 1855, quando o frade capuchinho italiano, Pacífico de Montefalco, levando a cabo sua missão evangelizadora para com os habitantes da região, torna-se o primeiro Vigário da Paróquia de Itaporanga, então denominada São João Batista do Rio Verde. Essas terras Haviam sido doadas pelo Barão de Antonina, João da Silva Machado, à diocese de Sorocaba para o fim de evangelização, sobretudo para com os indígenas que na ocasião se encontravam aos derredores de Faxina, hoje Itapeva – SP.

Em meados de 1936, todavia, a Igreja de São João Batista, que havia sido palco de crimes políticos, foi completamente destruída a pedido do bispo, que então se preparava para a recepção dos cistercienses alemães, não apenas para cultivar as terras, conforme a espiritualidade beneditina e a tradição da Ordem Cisterciense, mas também para dar assistência religiosa aos paroquianos, que na época, estavam desprovidos de matriz paroquial, contando apenas com a Capela do Bom Jesus, que era, na verdade, a capela do cemitério.

A ausência de igrejas (templos) em Itaporanga até a dedicação da Igreja Abacial em 1967, foi comentada por D. Estevam Stork em uma sua homilia do ano de 2.000, publicada no livro “Sermões Cistercienses”,na qual nos contara que lhe causou grande estranhamento a primeira vez em que esteve na cidade, em 1956,ao perceber que a capela do lugar era de cemitério, que a matriz estava em ruínas, e o Mosteiro afastado… Mas na verdade, os monges alemães liderados por Dom Atanásio Merkle pensavam na construção de uma nova matriz já mesmo na década de 1940, porém não poderiam começar esse projeto antes de inaugurarem a ala do noviciado do Mosteiro, a qual ocorreu somente em 1957.

O projeto de espetacular arquitetura neorromânica da Igreja Abacial e Paroquial de São João Batista foi encomendada ao arquiteto alemão Prof. Albert Bosslet, o qual inspirou-se em uma de suas obras principais: a Abadia Beneditina de Münsterschwarzach, também situada na Alemanha. O projeto da Igreja de São João Batista é, na realidade, uma obra póstuma, já que seu arquiteto morreu antes da mesma ter sido começada.

A igreja neorromânica destaca-se não apenas pela imponência de sua proporção, mas também por sua sobriedade característica das igrejas abaciais medievais da Ordem Cisterciense, as quais presavam pelo esquivamento de estímulos visuais que distraíssem os monges do centro da celebração: a Eucaristia e a Palavra de Deus. Porém, não privada de sensibilidade pastoral, a Igreja de São João Batista foi ornada com belíssimos mosaicos da Via Sacra, uma vez que o Mosteiro é dedicado à Nossa Senhora da Santa Cruz, e também um grande mosaico de Nossa Senhora da Assunção, à qual se dirige toda a Ordem Cisterciense, além de um mosaico representando São João Batista, espécime senão protótipo do anacoreta cristão (ainda que não fosse monge), e de São Bernardo de Claraval, grande difusor da Ordem Cisterciense na Europa (ainda que não tenha sido seu fundador).

No templo ainda se destacam os vitrais multicolores, dentre as quais se sobressai o azul que alude ao manto da Virgem Maria; e nessa alusão à Nossa Senhora também se notam diversas representações de margaridas,que simbolizam não apenas a pureza, mas também o sofrimento e o martírio, conforme a simbologia medieval. As margaridas (em latim margarita: pérola) são ornadas com pequenas peças vermelhas, que aludem à gotas de sangue, representando ainda, não apenas o martírio dos cristãos, mas, principalente, ao sacrifício enfrentado pela comunidade cisterciense para erguer essa Casa de Oração e, sobretudo, devido a três membros da comunidade que morreram em prol da edificação da Abadia de Nossa Senhora da Santa Cruz: Ir. Remígio de Oliveira, o qual se ofereceu a Deus para morrer no lugar de seu Abade Dom Atanásio, que estava gravemente enfermo do estômago, vindo milagrosamente a se recuperar após a morte do irmão em 1959, do qual sempre veio a se recordar com lágrimas nos olhos; além do Pe. José Carlos Simões, Prior do Mosteiro, e do Ir. Nivardo Nüdling, mestre de obras de todo o complexo abacial de Itaporanga (mesmo da igreja), os quais faleceram em 1965, na ocasião em que voltavam de Santa Catarina para a aquisição do mármore para o piso da igreja de São João Batista… Que todos se recordem desses homens quando observarem a pureza das margaridas em meio às gotas de sangue que se entregam ao manto de Nossa Senhora, a qual sofreu aos pés do Sacrifício de Cristo na Santa Cruz!

Uma vez concluída a Igreja, a mesma foi solenemente consagrada pelo Núncio Apostólico Dom Sebastião Baggio, juntamente com Dom José Carlos de Aguirre e seu coadjutor Dom José Melhado, bem como o arcebispo de Botucatu, Dom Fr. Henrique Golland Trindade, O. F. M., contando também com a presença de numerosos outros padres.

Os católicos itaporanguenses, se hoje possuem uma bela Igreja Paroquial, devem eterna gratidão à perseverança de Dom Atanásio Merkle e de sua comunidade cisterciense, principalmente de Ir. Lucas Mertens, que com a Olaria do Mosteirinho de São José, fez mais de 1.000.000 de tijolos para a construção da igreja, bem como ao Mosteiro de São Bento de São Paulo, à Arquidiocese de Colônia e à Diocese de Trier, e também aos inúmeros benfeitores brasileiros, mas sobretudo os europeus, os quais colaboraram em quase uma década para a sua construção, já que nem todos os itaporanguenses desejavam que a mesma se efetivasse, uma vez que um grupo chegou mesmo a fazer um abaixo assinado para a diocese de Sorocaba a fim de impedir a construção do templo.

Hoje, mais do que nunca, é necessário recordar o sacrifício de tantos que nos antecederam, pois melhor será a saúde de uma árvore quanto melhor forem preservadas as suas raízes. Exultemos, então, a exemplo desses três monges, com aquilo que temos: a nossa vida, a nossa eterna e constante doação.
Ir. Alexandre, O. Cist.

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