Quase sempre quando pensamos em concorrência imaginamos que podemos perder clientes, mas a verdade é que podemos ganhar clientes sem nunca perder.
Para falar sobre o tema vamos recordar um pouco da nossa história, mais precisamente para o começo da década de 90. Uma das mudanças na década de 90 é marcada pela frase do então presidente Collor que ao abrir a economia brasileira para importação de vêículos disse que “comparados com os carros do mundo desenvolvido, os carros brasileiros são verdadeiras carroças”.
No ano de 1990 o mercado brasileiro era dominado pelas chamadas 4 grandes do Brasil (Volkswagen, GM, Ford e Fiat) com 93% de um mercado que emplacou 760 mil veículos no ano de 1990. Na verdade eram estas 4 marcas que já tinham fábricas no Brasil e produziam automóveis para nosso mercado.
Com esta abertura, certamente muitos se recordam que a primeira marca a se aventurar na importação de veículos para o mercado brasileiro foi a soviética (naquela altura já russa) Lada, mas a mesma não obteve o sucesso esperado (talvez pelo fato de alguns modelos serem tão ”carroça” quanto os que tínhamos por aqui) e acabou desistindo do mercado brasileiro.
Por outro lado também vimos desembarcar marcas como Alfa Romeo, BMW, Ferrari, Kia (Besta), Mazda, Mitsubishi (Eclipse virou febre), Nissan, Renault, Suzuki… Algumas marcas tiveram sucesso com a importação e decidiram instalar fábricas no Brasil, acompanhadas por Honda, Toyota e Mercedes, que já produziam motos, pick-ups, caminhões/ônibus respectivamente. A decisão da instalação das novas fábricas viria garantir o fornecimento de peças de reposição para a manutenção dos veículos.
A verdade é que 30 anos após a abertura temos hoje mais de 10 marcas com fábricas instaladas no Brasil (infelizmente a brasileira Gurgel não sobreviveu a isso, mas já enfrentava problemas mesmo antes da abertura), tivemos claramente uma melhora da qualidade (já não são carroças, embora nem todos possam comprar os melhores), os lucros por unidade vendida se reduziram, mas o mercado cresceu mais de 3 vezes (foi de aproximadamente 2 milhões de veículos emplacados em 2020 –Cenário Covid; 2,7 milhões em 2019, mas já chegou à aproximadamente 3,6 milhões em 2012 – pico do mercado automotivo no Brasil).
Se analisarmos pelo ponto de vista das marcas que aqui estavam, ainda que possam ter perdido percentual de mercado, o crescimento do número de veículos vendidos significa que praticamente mantêm a quantidade de veículos que vendiam no momento da abertura (em 2020 as 4 grandes emplacaram aproximadamente 1,2 milhão de veículos). Adicionalmente ao fato de praticamente manterem os volumes, o exigente e significativo mercado brasileiro levou a desenvolvimento de novos produtos que também foram/são importantes para as marcas em outros mercados pelo mundo (também passamos a exportar mais veículos).
Do ponto de vista do consumidor, podemos dizer que só se beneficiou com esta concorrência, pois além de preços mais justos, conta hoje com melhor qualidade, bem como uma rede de atendimento (concessionárias) mais próxima. O mesmo cliente viu também um aumento da oferta de empregos com a chegada das novas fábricas.
Curiosamente o mercado de automóveis no Brasil, busca instalar suas concessionárias exatamente próximas de seus concorrentes, pois entende que pode se beneficiar do fluxo de clientes que ao visitar uma loja de concorrente e não fechar negócio, pode entrar em uma loja da marca e encontrar o que procura, seja ele o produto em si, o atendimento, o custo de manutenção, as condições de financiamento, ou até mesmo um pacote que visa atrair aquele perfil de cliente, mas que a concorrência não oferece.
Ou seja, a estratégia aqui é que o cliente faça a escolha por atender o que ele procura e não por falta de opção. Entendo que esta deveria ser sempre a visão de qualquer empresa.
Outro exemplo que podemos utilizar para entender a concorrência, embora não diretamente ligado à economia, é o vestibular para acesso à faculdade. Todos, que já passaram, estão passando ou têm filhos em fase de escolha e entrada na faculdade, sabem que um dos pontos que acaba influenciando na escolha do curso é a concorrência (embora não devêssemos mudar de curso por isso).
Normalmente quando estamos escolhendo, identificamos nossa afinidade (como o carro, atendimento, pacote que procuramos) com as matérias do segundo grau, e a partir daí definimos uma lista de cursos compatíveis, mas no momento da escolha efetivamente vemos todos os pontos, entre eles a concorrência e a nota necessária para sermos aprovados.
Se escolhermos o curso com maior concorrência a nota necessária será maior, o que nos exige mais estudo.
A conseqüência desta escolha, e estudo para conseguir o objetivo, é que independente de conseguirmos entrar na faculdade escolhida, estaremos mais preparados e poderemos escolher outro curso sem maiores dificuldades ou ainda seguirmos estudando e conseguirmos ser aprovados no ano seguinte.
Igualmente o tema concorrência se aplica ao mercado de trabalho, pois na medida em que possíveis concorrentes no mercado de trabalho evoluem e se qualificam, precisamos também melhorar para assegurar nossos empregos.
Por final podemos concluir, que desde que o objetivo seja evoluir sempre, e atender as necessidades dos clientes ou manter nossos empregos a concorrência é sempre positiva. Os clientes supostamente perdidos, na verdade não tinham opção e mudam a partir do momento que passam a ter outras opções.
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Sidnei Almeida, natural de Itaporanga, formado em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Paraná com extensão em Gestão Econômica Financeira pela Fundação Dom Cabral, além de vasta experiência em grandes empresas na área de financeira e crédito e bancos como Banco do Brasil, HSBC, Banco Renault/Santander e atualmente BNP Paribas, líder europeu.