Sidnei Almeida: Orçamento Familiar. Onde dói mais a sua ferida?

Falar de orçamento familiar, ou ter um orçamento familiar não é comum para nós brasileiros, mas deveria ser. Vamos tentar entender o motivo de não tratarmos como deveria, e passarmos algumas dicas sobre o assunto.

A inflação vivida na década de 80 é um dos motivos que influenciaram a nossa “falta de educação financeira”, e conseqüente inexistência de um orçamento familiar. O motivo é que a inflação descontrolada, e uma poupança que não acompanhava a inflação (nunca acompanha, mas hoje podemos dizer que é mais próxima) resultavam em uma necessidade de pagarmos todas as contas e fazermos todas as compras do mês logo após o recebimento dos salários, pois os preços subiam diariamente. Outro motivo pelo qual evitamos tratar é pouparmos nossos filhos sobre este assunto, o que também é um erro pois ele é muito importante na vida adulta e nosso exemplo ajudaria muito.

Então como podemos elaborar um orçamento familiar? Hoje, sem inflação diária, já é possível elaborarmos um orçamento e temos diversos recursos para elaboração, sendo que podemos encontrar na internet (internet não funciona apenas para facebook, whatsapp, instagran…) alguns modelos já prontos em Excel. Vamos listar os itens básicos que devem fazer parte do orçamento, e que podem ser organizados até mesmo com um caderno.

O primeiro ponto que faz parte do orçamento é a renda que recebemos mensalmente, ou seja, o salário. Importante considerar a soma dos salários de todos que colaboram no pagamento das despesas (considerar até onde vai o compartilhamento de salário e despesas). O ideal é considerarmos apenas salário fixo, pois comissões e outras possíveis variações devemos evitar incluir no orçamento (se possível fazer uma reserva/poupança com este “extra”). Ainda sobre salário, sabemos que em nossa região temos algumas ocupações que não possuem salário fixo mensal, para as quais recomendamos que se estabeleça um valor máximo para os gastos mensais, compatível com o total que se espera receber durante o ano ou o período de uma safra por exemplo.

O segundo ponto é listarmos as despesas fixas, onde estão todas as despesas que não conseguimos alterar em curto prazo, como impostos (nos meses em que ocorrem) aluguel ou prestação da casa, prestação do carro e medicamentos de uso contínuo quando existirem.

A última lista a elaborar é das despesas variáveis que podem ser eliminadas ou reduzidas até certo limite, por exemplo, telefone/internet, plano de saúde, seguros, vestuários, cuidados pessoais, diversão, alimentação, água, luz, gás, transporte…

Após estes primeiros passos é importante definirmos objetivos para a compra de algum bem mais caro como alguns eletrodomésticos, um carro, estudos dos filhos ou até mesmo uma viagem. Assim podemos saber quanto é necessário poupar mensalmente para estes objetivos e incluir o valor no orçamento.

Por último, e muito importante é estabelecer uma reserva de segurança que pode ser utilizada em casos inesperados como algum medicamento/consulta de emergência, conserto do carro, algum reparo na casa. A importância desta poupança é evitarmos adiar um objetivo ou ainda ter o orçamento de um mês apertado ou deficitário pela emergência surgida.

Com tudo listado chega o momento de fazermos as contas e ver se os rendimentos são suficientes para as despesas e poupanças que planejamos. É quando vemos onde nossa ferida dói mais. Para isso é necessário analisar o peso de cada despesa/poupança sobre os rendimentos/salários. Por exemplo, se temos a soma das despesas fixas correspondendo a 60% dos rendimentos significa que temos alguma possibilidade de ajuste apenas nos outros 40%, mas que também pode ser limitada (podemos mudar a alimentação para uma mais barata, mas não vivemos sem ela). Quando identificamos a necessidade de algum ajuste é necessário que todos os membros da família estejam cientes e engajados para o sucesso.

O ideal é que as despesas (fixas e variáveis) correspondam ao menor percentual possível de nossos rendimentos, assim as poupanças nos permitem realizar nossos objetivos e passar por momentos de emergência sem grandes percalços (infelizmente não é a realidade da maioria dos brasileiros). Vale também ter cuidado com as pequenas despesas e incluí-las no orçamento, pois mesmo que possam ser pequenas “é de grão em grão que a galinha enche o papo“.

Os conceitos aqui apresentados de rendimentos, despesas (fixas ou variáveis), poupanças são ajustáveis a cada indivíduo, mas o conceito de orçamento ideal (despesas menores que rendimentos) se aplica a todos.
Consegue identificar onde dói mais sua ferida? O melhor é não doer, ou ainda nem ter ferida…
Por último gostaria de registrar que entendo que economia financeira ou finanças pessoais poderia ser uma matéria complementar na escola, ajudando ainda mais a termos esta cultura (cheguei a ter aulas de Contabilidade no Epitácio Pessoa).

Envie sugestões de temas, dúvidas, críticas através do e-mail modesto18@gmail.com ou através do Messenger do autor (Sidnei Almeida).

Sidnei Almeida, natural de Itaporanga, formado em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Paraná com extensão em Gestão Econômica Financeira pela Fundação Dom Cabral, além de vasta experiência em grandes empresas na área de financeira e crédito e bancos como Banco do Brasil, HSBC, Banco Renault/Santander e atualmente BNP Paribas, líder europeu.

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João Ribeiro
João Ribeiro
7 de setembro de 2021 11:02

-Obrigado Sidnei pelos ensinamentos passados e, mais uma vez, parabéns ao Itaponews por disponibilizar aos leitores esta seção, que, na falta do conteúdo sobre economia nos ambientes escolares, nos privilegia com as matérias deste nobre amigo.